Um dos principais expoentes do debate cultural no âmbito do marxismo, o intelectual Antonio Gramsci dizia que todos os indivíduos são intelectuais, visto que participam, em maior ou menor grau, de uma determinada visão de mundo, recheada de valores, expectativas, hábitos e de percepções sobre a realidade. Ainda que somente uma parcela exerça efetivamente a função de intelectual, todas as pessoas, na medida em que difundem essa ou aquela visão de mundo, contribuem para conservar ou transformar a existência humana.
Sua teoria política contribuiu para enriquecer e reoxigenar a esquerda brasileira a partir da década de 80, quando o Leste Europeu vivia a crise do socialismo real. Vista a partir de então com menor preconceito e não mais como um reflexo automático da base econômica, a cultura passou a ganhar maior importância na luta social da esquerda, contribuindo para a construção de novas práticas, novos sujeitos sociais e revelando uma maior atenção à formação de valores e atitudes políticas.
O nível das discussões nos marcos do processo eleitoral para a presidência do Brasil revela traços exemplificativos da teoria gramsciana, na proporção em que expõe a cultura manifestada enquanto filosofia de fé num cenário de disputa entre projetos em boa medida antagônicos. Afinal, é isso que sugerem os argumentos irracionais e críticas de baixo calão, cuja agressividade extrema sugere que estamos diante da final de uma Copa do Mundo e não de visões de país que, transformados em políticas públicas, vão beneficiar a interesses tais ou quais na sociedade brasileira.
É, portanto, absolutamente compreensível que certas camadas da sociedade depositem confiança no projeto representado por Aécio Neves. Durante o governo do PSDB, o acesso à universidade pública era privilégio de setores economicamente favorecidos, assim como o ingresso nos melhores cargos através de concurso público. Contratar empregados e empregadas era relativamente mais fácil, barato e menos burocrático no governo tucano. O problema é quando isso é mascarado por argumentos moralistas e acríticos, que apontam a corrupção como exclusividade deste ou daquele partido e não como resultado de um sistema político que começou muito tempo atrás para favorecer os donos do poder – os mesmos que impedem que o povo decida sobre um modelo mais democrático e menos excludente de sistema político.
A moralização e afirmações irreflexivas como as que apontam uma necessidade de alternância de poder buscam, na realidade, esconder caminhos e assertivas diferentes para o país. A luta pela realização de novos valores humanos não se encerra nas eleições de outubro, corresponde a um longo caminho a ser percorrido para que possamos viver com inclusão social, sem preconceitos e intolerância entre as pessoas. Além das questões econômicas e de distribuição social, está em jogo a busca contínua e perpétua pela construção democrática e o direito à vida e à liberdade. E é por isso que, do lado de lá, estão Marco Feliciano, Pastor Everaldo, Bolsonaro e Silas Malafaia, verdadeiros retrocessos civilizacionais.
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