Antes do Inverno (2013), de Philippe Claudel |
Assisti recentemente a um belíssimo filme argentino chamado Lugares Comuns (2002), em que no centro do enredo está um casal beirando os 60 anos, ele professor universitário e ela uma assistente social, também com um filho e neto, que, diferentemente de Paul e Luci, possuem uma simetria ímpar em torno dos prazeres da vida e uma semelhança de ideais que os torna autênticos companheiros. É contrastante com a enorme sala de jantar de Antes do Inverno, onde o casal escuta música clássica e conversa pouco. Não há o que dizer. Ela abdicou de uma vida profissional em nome da família, enquanto ele mal fica em casa e quase não tem tempo para a esposa em virtude do trabalho. Seus mundos são tão distantes que quando Paul pergunta a Luci por que ela acorda tão cedo, Luci responde que é para vê-lo um pouco, antes que Paul saia para o trabalho sem hora para voltar.
Quando Paul encontra Lou (Leila Bekhti), atendendo numa brasserie, e esta lhe diz que já foi tratada por um problema de apendicite por ele, estranhamente Paul começa a receber buquês de flores em sua casa e no seu consultório, provocando uma reviravolta em sua vida. Ele desenvolve uma relação de afeto por Lou à medida em que se aproxima dela, comovendo-se com sua vida quanto mais a conhece. O efeito é semelhante ao provocado na personagem de Woody Allen, Rowlands, em A Outra (Another Woman, 1988), uma mulher fria, metódica e organizada, cujos medos parecem despertar ao escutar, por acaso, a história de uma jovem grávida ao seu psiquiatra.
Em determinados momentos do filme, Paul mostra o quanto sua vida corre sem sentido, como quando confidencia ao seu amigo que nunca sonhou com nada e que deixou a vida rolar como uma pedra. Não é a mesma preocupação de Ivan Ilitch (A Morte de Ivan Ilitch, 1886, de Tolstói), um dedicado burocrata, que sempre buscou uma solução para sua vida pessoal e profissional que fosse satisfatória diante de seus amigos mais altamente colocados, e que ao descobrir-se com um problema na região do rim que lhe encerraria a vida, reflete que estava descendo a montanha achando que a galgava?
O mistério em torno da jovem atendente, Lou, é resolvido de maneira surpreendente, mas em harmonia com a obra. As paisagens bucólicas e a trilha sonora estão em plena sintonia, revelando muito sobre a busca pela estabilidade e a irreflexão do personagem principal em torno de um estilo de vida previsível, constante e seguro.
NOTA: 8,5
NOTA: 8,5
Nenhum comentário:
Postar um comentário